Crônica - Pagú e a sua consciência social - Manoel Messias Pereira

-9?6/1910  + 12/12/1962

Pagú e a sua consciência social

O mês de março geralmente tecemos em todos os níveis comentários sobre as mulheres guerreiras, revolucionária, escritoras, donas de casas, trabalhadoras, pessoas de todos os meios sociais. Mas ouço sempre tocar Rita lee ou Maria Rita, uma música que diz mexo e remexo na Inquisição...eu sou pau pra toda a obra, ...não sou freira nem sou puta, essa obra de arte sonora fala de Pagu. Uma menina que estudou normal, que fazia poesia, se encantou com Oswald de Andrade aos dezenove anos, ficou grávida dele, casou se com ele e com mais tarde com o escritor Geraldo Ferraz. Que escreveu um romance proletário com o nome de Mara Lobo, e merece ser lembrada sempre no contexto da história do Brasil.

Seu nome é Patricia Rehder Galvão, conhecida por pagu, pois o poeta Raul Bopp, escreveu o poema Coco para ela, e que fala exatamente assim :

Pagu tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer
Bate-coco quando passa
coração pega bater
Eh Pagu Eh
Dói porque é bom de fazer doer.

O que defendia Patricia  Galvão-a Pagú, a participação ativa da mulher  na política e foi a primeira brasileira do século XX a ser presa. Na sua biografia disse que aos quinze anos ela já colaborava com os jornais e usava o pseudônimo de Patty. 

O casal Oswald de Andrade e Tarsília do Amaral a apresentaram ao movimento antropofágico e praticamente adotaram-a. Tendo em 1930 Oswald separado de Tarsila, que era sua amiga, porém já havia uma relação de afetividade amorosa entre ela e Oswald e ela já anunciara a sua gravidez, a de Rudá de Andrade.

O escritor Flavio Moreira da Costa ao escrever sobre Pagú, pede que o compositor e ator Mario Lago que escreveu a obra musical "Amélia", perdoe-nos pois a mulher de verdade foi Patricia Redher Galvão, que escreveu como Mara Lobo, ou Solange Sohl, ou mesmo como a inocente Patty, mas foi uma revolucionária, agitadora, feminista, avant la lettre, que já criticava o feminismo burgues da elite e tinha uma postura muito próxima das feministas comunistas de hoje que integram o Coletivo Ana Montenegro. Foi romancista, poeta, cronista, correspondente, viajante e sobretudo comunista. Pode até ter errado na sua formulação de militância no Brasil e na França, porém ninguém pode alegar que o seu papel, como uma ser humana dotada de consciência social não tenha sido   fundamental  para uma reflexão a luz da existência da necessidade de uma revolução de fato.

Quando perguntaram numa ocasião na revista, intitulada "Para todos", sobre o que Pagú achava da antropofagia. Ela respondeu "Eu não penso eu gosto". E na oportunidade ela revelou que tinha sessenta poemas censurados, que ela dedicava todos ao diretor da Censura cinematográfica Dr. Genolino Amado.

Patricia Galvão foi a Argentina, para uns ela foi participar de um Festival de Poesia para outros foi mandada para lá e conheceu Luis Carlos Prestes e foi como descobrir um mundo novo. Ela volta para o Brasil e filia-se ao Partido comunista Brasileiro-PCB.

Segundo Flavio Moreira da Costa, o partido Comunista organizou uma manifestação em Santos, devido a greve dos estivadores, e ao que parece era uma homenagem aos anarquistas Saco e Vanzetti, mas Patricia estava escalada como oradora, mas quando a repressão chegou foi ela que levantou a cabeça ensanguentada de um estivador morto. Contam que ela teria resistido a prisão, mas ela mesmo depois desmentiu, enfim ela foi presa e Oswald de Andrade foi lá pra retirá-la e acabou preso também. Pagú ocupou o cárcere numero 3 do Casarão dos Andradas, segundo o Secretário de Segurança da época, o general Miguel Costa o pior cárcere do continente.

Depois disto um pouco adoentada e incomodada resolveu ir para o mundo como correspondente, passou por Estados Unidos, Japão Manchúria, foi para Moscou e não gostou. foi para a França virou comunista com o codinome de Leonnie, militante da Juventude comunista da França, conheceu Aragon, o surrealista, o escritor André Breton, o militante Benjamim Péret, frequentou a Universidade Popular foi aluna de Politzer e de Paul Nizan, o marxista e grande escritor, também trabalou como tradutora e quando estava pra ser deportada foi salva pelo embaixador brasileiro Souza Dantas, que extraditou para o Brasil, onde chegou no porto de Santo sendo-a recebida por Oswald de Andrade e filho.

Pagu, depois de ter sido acusada por Agildo barata em um panfleto, verdade e Liberdade, depois de ter militado na França. saiu da prisão em 1940, desligada do partido foi acusada de trotsquista, casada com Geraldo Ferraz, escreveu "A famosa Revista", o romance Arthur Koestler, O Zero e o Infinito. Acabou mesmo com os trotskistas como Mario Pedrosa, Geraldo Ferraz e Edmundo Moniz, que editava a Vanguarda Socialista. E assim ela teceu criticas até mesmo em Mario de Andrade.

Na peça de Alcides Nogueira, Tiete, tiete, Mario de Andrade e Oswald de Andrade são tratados com irreverencia e apenas Patricia é tratada numa personagem positiva. É assim que entendemos que Patricia Galvão que assinou poesias, romances, crônicas. Foi comunista, uma revolucionaria, que tinha a luta de classe como sentido na sua obra. E como disse na obra de Rita Lee, não foi freira, não foi puta, e nem toda feiticeira é corcunda. E mexe e remexe na fogueira da Inquisição. Enfim ninguém pode alegar que o seu papel de consciência social não tenha sido fundamental, para a reflexão da necessidade de uma revolução social.


Manoel Messias Pereira

cronista, poeta, professor
Membro da Academia de Letras do Brasil -ALB
São José do Rio Preto-SP.






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